No Brasil, estima-se que haja uma média de 25 suicídios por dia. Uma
tentativa aumenta em 50% a chance de uma segunda investida. E mais de
90% dos casos estão ligados a problemas de saúde mental. Como se fala
muito pouco sobre o assunto — salvo quando um caso como o do músico
Champignon ganha as manchetes — os indícios do suicídio, considerado um
tabu social, são mal conhecidos. Mas a única forma de evitá-lo é adotar
estratégias de prevenção e, para isso, é preciso conhecer os sinais.
“Estão envolvidos em uma tentativa de suicídio os fatores
predisponentes, como genética, psiquismo do indivíduo, círculo social,
ambiente familiar e até religião. E os precipitantes, aqueles fatores
que motivaram o ato”, diz José Manoel Bertolote, autor do livro
“Suicídio e sua Prevenção” (Editora Unesp) e especialista em psiquiatria
da Unesp em Botucatu.
Mas 90% dos casos de suicídio estão atrelados a algum problema de
saúde mental, como depressão, transtornos de personalidade, alcoolismo,
abuso de drogas, bipolaridade ou esquizofrenia, entre outros.
“Quem fala não faz” é um mito comum sobre o suicídio. A maioria dos
suicidas dá sinais claros de que vai se matar. “São praticamente
anúncios. Normalmente os mais jovens são mais diretos. Eles verbalizam
claramente, ou avisam pelas redes sociais, por email. Já os mais idosos
são mais sutis. Eles se despedem distribuindo posses”, diz Bertolote.
Há também os sinais indiretos, que precisam ser decodificados. Um
tipo de sinal, neste caso, é começar a colocar a vida em risco, como
abusar de álcool e drogas, dirigir de forma irresponsável, brincar com
armas de fogos perigosas. São os chamados suicidas passivos.
Para Karen Scavacini, gestalt terapeuta e mestre em saúde pública de
promoção de saúde mental e prevenção ao suicídio, outro mito é
relacionado ao tabu que cerca o tema: perguntar se a pessoa pensa em se
suicidar não a induzirá ao ato. Ao contrário, falar sobre o assunto pode
salvar muitas vidas. “Se você ficou desconfiado diante dos sinais,
pergunte a ela: ‘você está pensando em se matar?’ Faça então um
encaminhamento desta pessoa. Não precisa ser só para o psicólogo ou para
o psiquiatra. Pode ser para o padre, o diretor da escola, o agente
comunitário, o bombeiro”, aconselha Karen.
Um estudo realizado pela Unicamp detectou que, no Brasil, 17 de 100
pessoas pensam seriamente em se matar. Com o silêncio que cerca o tema, a
abordagem do suicídio como problema de saúde pública ainda engatinha.
“Não existe no País saúde pública que dê conta deste fenômeno. A
Estratégia Nacional de Prevenção continua até hoje no papel. O médico da
unidade básica deveria ser o primeiro a detectar indícios”, diz.
Na Europa, as taxas de suicídio estão diminuindo porque a prevenção
funciona. Já nos Estados Unidos foi lançada a campanha “Amigo bravo é
melhor que amigo morto”, para incentivar os jovens a não manterem
segredo e contarem o que sabem sobre as intenções dos colegas. “No
Brasil, simplesmente não se fala no assunto”, completa Karen.
A voluntária do CVV Adriana Rizzo, que dedica quarto horas por semana
para ouvir e aconselhar pessoas que pensam em se matar, diz que
mudanças bruscas de comportamento são as principais pistas que o suicida
dá. “Eram pessoas muito tímidas e, do nada, ficam muito agitadas.
Também acontece uma retirada da vida social, um isolamento, ou abuso de
álcool e drogas“, alerta.
Além da mudança de personalidade, ligue o alerta quando notar grande
alteração alimentar ou de sono, sentimento de desvalor e desesperança.
Pessoas que tiveram perdas recentes, como mortes, divórcio, histórico
familiar de suicídio ou que tiveram diagnóstico de doença grave, fazem
parte do grupo de risco.
O quanto antes se detectar, mais fácil prevenir. “Bem como intervir
em crises”, conta a voluntária Adriana. “O nosso trabalho é oferecer
atenção e conversar com a pessoa sobre um assunto que ela quer dividir e
não consegue, pois se sente julgada, criticada. Ao desabafar e
compartilhar o que está lhe afligindo, ela se sente valorizada. A gente
procura a entender por que ela quer desistir de viver. Para o copo não
transbordar, ela precisa esvaziar o que está sentindo antes”.
Ambivalência
Nem todo suicida quer morrer, apenas quer mudar a situação. Todo
suicida é ambivalente: uma hora ele quer, na outra não. De acordo com
Bertolote, isso explica porque muitas vezes, quando o suicida fez uso de
um método letal e está à beira da morte, bate o desespero e ele se
arrepende.
Tanto para quem convive com um suicida em potencial ativo, que toma
objetivamente a decisão, quanto para quem vive com um passivo, que adota
comportamento abusivo em busca de um “acidente”, o conselho mais
importante é não ignorar qualquer sinal. Leve a sério as ameaças e tome
providências para ajudar a pessoa em risco. “O tratamento dos
transtornos mentais é a primeira intervenção. Isso porque a maioria dos
suicidas têm um transtorno como depressão, alcoolismo ou esses dois
males associados”, diz Bertolote.
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