Estudo da Universidade de São Paulo (USP) com 257 mulheres que
deram à luz em um hospital público mostra que 28% delas sofreram de
depressão pós-parto. O índice é pelo menos duas vezes maior do que o
descrito pela literatura mundial, que varia de 10% a 15%. A pesquisa foi
desenvolvida pelo Instituto de Psicologia e pela Faculdade de Medicina
com gestantes que fizeram o pré-natal em unidades básicas de saúde, no
bairro do Butantã, e o parto no Hospital Universitário da USP.
A análise das estatísticas dos dois hospitais mostrou um conjunto de
fatores considerados de risco para a depressão pós-parto. Entre eles,
estão a ocorrência de depressões anteriores, qualidade da relação com o
parceiro, o apoio social e os anos de escolaridade.
"Os fatores
apontados devem ser interpretados dentro de um contexto mais amplo e
considerados em suas interações. Contudo, as mulheres atendidas no
hospital público apresentaram maior número de fatores de risco",
esclareceram as coordenadoras do projeto Emma Otta, Vera Sílvia Bussab,
Maria de Lima Salum e Morais, em entrevista à Agência Brasil. Nas duas
amostras, os recém-nascidos apresentaram condições de saúde semelhantes.
A idade da mãe, a escolaridade, o número de visitas pré-natal e de
cesarianas foram maiores entre as mães do hospital privado.
As mães e os filhos foram acompanhados nos três anos após o
nascimento com objetivo de identificar as interferências da depressão no
desenvolvimento cognitivo das crianças. A pesquisa mostra que, embora
as mulheres com depressão pós-parto tenham se considerado piores mães,
isso não interferiu significativamente na interação deles. "Elas
relatavam que o bebê dava mais trabalho, que tinham mais dificuldades
nos cuidados com a criança, que eram mais impacientes e que dedicavam
menos tempo ao filho", explicam as pesquisadoras.
Já no quarto mês de vida, observadores externos perceberam que as
mães com sinais de depressão pós-parto conversavam menos com os bebês,
especialmente quando já tinham outros filhos, e também que os filhos
procuravam menos o olhar materno. Nessa fase, no entanto, não houve
diferença significativa, contudo, em outros comportamentos interacionais
nem motores.
Aos 12 meses, por outro lado, os filhos de mães depressivas
apresentaram pior desempenho em tarefas de desenvolvimento motor, mas
mostraram melhor desenvolvimento da linguagem oral. Para as
pesquisadoras, isso pode ser justificado pela maior necessidade de as
crianças exibirem comportamentos que chamem a atenção de outras pessoas.
Por meio da análise de vídeos, também foi possível perceber nessa fase
que as crianças exploravam menos o ambiente, manipulavam menos os
brinquedos e apresentavam mais movimentos repetitivos na interação com
uma pessoa estranha.
Foram feitas análises ainda aos 24 meses e aos 36 meses. Com 2 anos,
foram avaliados a empatia e os comportamentos sociais do bebê. Em uma
situação experimental, o pesquisador simulou estar desapontado e a maior
parte das crianças, independentemente da condição materna, tentou
ajudá-lo. Aos 3 anos, foram mais frequentes os casos em que filhos de
mulheres depressivas ignoraram as solicitações da mãe.
O estudo mostra que alguns fatores atenuam a influência da depressão
materna sobre o desenvolvimento da criança. Em relação às mães, entre
outros fatores, são importantes o apoio do parceiro e da família. Por
parte da criança, "fatores como temperamento, resistência ao estresse,
tempo com a mãe, entre outros, podem ser responsáveis pela variação
comportamental".
As pesquisadoras destacam ainda que medidas simples podem ser úteis
para diminuir o impacto do transtorno. Uma delas seria adotar uma ficha
de atendimento das gestantes com informação sobre ocorrência de
episódios anteriores de depressão. "Esse foi um importante fator de
risco na nossa amostra", justificam.
Outra estratégia é o rastreamento de indicativos do transtorno
durante a gestação ou ainda no primeiro mês após o parto. "Isso
permitiria o encaminhamento dessas mulheres para o tratamento do
transtorno e, adicionalmente, permitiria planejar o acompanhamento delas
com mais atenção", propõem. A capacitação permanente dos profissionais
de saúde pública sobre a depressão pós-parto também é considerada uma
medida fundamental.
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